A euforia de Charles Leclerc ao vencer o GP de Mônaco significa muito mais do que a sensação de enfim vencer em casa. A conquista também representa a chance de recomeçar e tentar virar o jogo não só em termos de campeonato, mas também dentro das garagens de Maranello. É hora de tirar proveito das oportunidades

CHARLES LECLERC PRECISOU DE 1 ANO, 10 meses e 16 dias para subir novamente ao lugar mais alto do pódio na Fórmula 1. Neste meio tempo, o monegasco atravessou uma fase errática e muitas vezes apagada, viu o companheiro de equipe ganhar duas vezes e ainda teve de lidar com um incômodo questionamento sobre se a Ferrari, de fato, havia escolhido o ‘Carlos’ certo para seguir no time e formar com Lewis Hamilton a dupla de 2025. Acompanhou também a transição de chefia dos italianos, entre Mattia Binotto e Frédéric Vasseur, e só agora parece enfim ter tudo nas mãos para virar o jogo. Mas faltava vencer.
E a vitória nas ruas de casa, no Principado cravado no sul da França, foi caprichosa e exigiu tudo — da frieza para manter tudo sob controle à tensão para não se deixar levar pelo passado infeliz. Porque, sim, o histórico de Leclerc em Mônaco era, no mínimo, uma espécie de maldição. Mesmo rápido e saindo da pole em outras duas oportunidades, Charles já se viu fora da corrida antes mesmo do apagar das luzes, sem contar o ano em que lamentou as péssimas decisões do pit-wall ferrarista. Também houve falta de performance e as mazelas da estreia. Agora, tudo ficou para trás e não poderia ser em melhor hora.

O caso é que agora a Ferrari tem um comando mais assertivo e menos histérico. Vasseur é um homem cuidadoso e que entende a demanda do cargo que ocupa. Sob sua chefia, a escuderia italiana foi capaz de se reorganizar e evoluir, e isso se refletiu nos pilotos. O desenvolvimento da SF-24, modelo que foi pensado inteiramente sob a gestão do francês, tem sido gradual e eficaz. Por exemplo, neste ano, os engenheiros anularam a falha crônica de desgaste de pneus e entregam um carro veloz e mais equilibrado. A vitória de Carlos Sainz na Austrália até levantou dúvida sobre a performance real dos italianos, especialmente pela ausência de Max Verstappen, que abandonou com problemas de motor, mas o triunfo em Mônaco foi limpo, com todos os adversários em pista.
É importante dizer também que Leclerc parece confortável no carro que pilota e mais: está maduro, compreendendo também os altos e baixos do esporte. Em Monte Carlo, foi o mais rápido na sexta-feira, conquistou a pole e venceu de ponta a ponta. A Ferrari finalmente entendeu o regulamento como um todo, e isso abre chances de vitórias. Se será suficiente para brigar pelo título é uma outra questão, mas é notório o crescimento e o potencial — de equipe e piloto. Por isso, um triunfo como esse é capaz de mudar a história de uma temporada.

“É uma sensação fantástica, foi importante para a equipe e para o Charles. Todos sabemos qual era a situação, Charles sempre teve muito azar em Mônaco. Foi uma conquista importante para ele, precisava disso. Agora vamos aproveitar o momento e depois nos concentraremos na próxima”, disse um satisfeito Vasseur antes de ser jogado ao mar para celebrar o segundo triunfo da Ferrari em oito etapas até aqui em 2024.

Frédéric também corrobora a impressão de que Mônaco será mesmo o ponto de virada. Há um ano, a equipe italiana penava atrás da Red Bull e, hoje, se aproxima de maneira contundente. O cenário é outro, e isso tem feito a diferença. “Acho que, no ano passado, Charles estava um pouco estressado quando chegamos a Mônaco, mas este ano o vi muito mais relaxado.”
“Desde a primeira volta no primeiro treino, Charles esteve confortável e teve um ritmo excelente em todas as sessões. Mesmo quando houve momentos difíceis, como no Q1, quando bateu com a asa dianteira em um saco plástico, teve calma e fez um ótimo trabalho. Depois, manteve a corrida sob controle da primeira à última volta. Honestamente, foi um fim de semana perfeito”, completou o dirigente francês.

De fato, foi um fim de semana impecável. Mas é também verdade que Leclerc tem se mostrado mais consciente a temporada toda. É o piloto mais consistente até o momento, tendo pontuado em todas as provas até aqui, sempre entre os quatro primeiros. Ainda, assumiu a vice-liderança do Mundial de Pilotos e está a 31 pontos de Max Verstappen — parece muito, mas há ainda 16 etapas pela frente, com mais 4 finais de semana de sprint.

É claro que uma disputa mais firme pelo título até o fim vai depender de outros fatores, incluindo o próprio tricampeão e a McLaren, que segue muito forte. Mas a questão agora é que Charles parece ter desatado um nó importante, aquele que proporciona uma segunda chance.
A Fórmula 1 retorna de 7 a 9 de junho com o GP do Canadá, nona etapa da temporada 2024. Grande Prêmio